Um sonho de Kafka

Daniela Mendes

 

Eu tive uma estranha comunicação com Paloma. Ela morava na costa de uma ilha e eu no farol da outra vizinha. Eu costumava observá-la da minha luneta, seu vestido de corte perfeito, muito rodado, bem alvejado, pele também muito branca, cabelos negros quase azuis cheios de cachos, batom vermelho berrando a boca em silêncio. Ela sofria, por causa do vento, para estender no chão um lençol do tamanho de uma vela de navio. Neste, ela ia escrevendo para mim com uma pena e sangue guardado num vidrinho. Dizia que se apaixonara por um homem horrendo. Eu lia sua história pela luneta e escrevia também num lençol de mesmas proporções que o dela: o amor sempre dá certo, mesmo quando a gente não percebe. Estendia na janela e, enquanto esperava sua resposta, dando sucessivas conferidas para rir do vento que fazia de Paloma uma desajeitada, eu lia as aventuras de Yoyo Soyer e el Dibujador de Armas.

Yoyo Soyer é um anão com cara de cachorro que descobre que su papá es el grande Dibujador de Armas. Um hombre gordo, que tem o corpo em formato de bola de baskete e orelhas de porco. Ele jamais tira los óculos ray ban. Elle, su papá, no recoñestes la paternidad e se divierte faziendo brincaderas sádicas com caráter sensível de su hijo. Mas, vez em cuando, elle deixava transparecer um caracter extremamente paternal. Una vez, el presidente careca lhe pediu o pequeno favor de fuzilar 5 judeus com uma bala. El Dibujador de armas pediu para su hijo se trancar dentro de uno baú de tesouros enquanto elle fazia lo trabajo. O problema, é que terminado o labor, lo Dibujador de armas esqueceu su hijo. Foi beber cervecitas com sus amigos. E Yoyo Soyer, ficou 12h triste e desolado imaginando o que afinal teria acontecido com su papá.

Depois de dar gargalhadas com a tirinha, observava Paloma da minha luneta novamente. Ela não me escrevia mais. Ao invés disso, se deitou no pano estendido e o vento a cobriu com ele. A tinta da boca atravessou o lençol. Acho que não era de algodão.